Como montar uma carteira de dividendos
Por Janaina Lage
Uma boa carteira de dividendos reúne ingredientes de diversas naturezas: papéis com histórico de bons pagamentos, empresas com perspectiva de crescimento para os próximos anos, boa liquidez, política de pagamentos bem definida… À primeira vista, pode parecer tarefa apenas para “iniciados”, mas de acordo com os analistas consultados, o primeiro passo é descobrir o seu perfil de investidor e ficar atento para que a mistura não desande.
Zulmir Tres, diretor da corretora Diferencial, afirma que para montar uma boa carteira de dividendos, o investidor precisa definir seus objetivos. “Se ele pretende obter um investimento de um, dois ou até cinco anos, dispondo de uma carteira que funciona de forma semelhante a um investimento em renda fixa, por exemplo, ou se ele deseja obter rentabilidade a curto prazo, não quer ficar com os papéis por muito tempo. Existe ainda uma terceira hipótese, a carteira mista, que reúne papéis que ele possa movimentar com mais facilidade e uma parte mais conservadora”, explica.
Liquidez não deve ser deixada de lado
Muitos investidores procuram um investimento de longo prazo quando aplicam numa carteira de dividendos. Analistas afirmam que, mesmo quem está à procura de um rendimento para toda a vida deve procurar ter em mãos papéis com um mínimo de liquidez. “Nada me adianta ter um papel que paga um bom dividendo se eu não conseguir vendê-lo porque ele não tem boa liquidez”, afirma Zulmir.
Clarissa Saldanha, analista do banco Brascan, destaca que se o investidor pretende somente receber dividendos, a liquidez pode figurar como um item secundário. “O problema que se coloca para quem procura apenas alto valor de dividendos é o valor dos juros. Em alguns casos, se não se vai levar em conta a liquidez, talvez seja mais atraente investir diretamente em renda fixa. O ideal é sempre juntar boa liquidez com bons dividendos”, diz.
O analista da consultoria Lopes Filho e Associados, Aloísio Lemos, lembra um caso típico. “Há algum tempo, os investidores mais conservadores viviam comprando ações da Eternit. A empresa pagava um valor muito bom de dividendos, mas sua liquidez era praticamente nula”, diz. Aloísio afirma que a liquidez deve ser sempre considerada como um fator importante na escolha dos papéis. “É sempre importante poder sair do papel”, diz.
Dividendo passado não é garantia de dividendo futuro
“É preciso considerar o histórico de pagamento de dividendos da empresa. Não é porque ela pagou bons dividendos no ano anterior, que vai pagar sempre”, afirma Clarissa Saldanha.
A analista explica que eventos específicos podem alavancar o faturamento de uma empresa num determinado ano, mas o “milagre” pode não se repetir. “Às vezes, num determinado ano, uma empresa pode ter pago um valor fabuloso, mas isso pode não acontecer mais. Quem investe sem conhecer o histórico de pagamentos, pode acabar perdendo dinheiro”, diz.
“O investidor deve considerar a perspectiva de crescimento da empresa e do setor em que ela atua, antes de incluí-la na carteira”, afirma Aloísio Lemos, analista da consultoria Lopes Filho e Associados. Outra forma de separar o joio do trigo é acompanhar o dividend yeld da empresa.
Clarissa Saldanha explica que o dividend yeld é a relação do dividendo sobre o preço da ação. (Para saber mais sobre este índice, confira o Entenda o famoso dividend yeld).
O mercado brasileiro não é muito rico em papéis que tenham tradição em pagar bons dividendos. Os analistas consultados recomendam os seguintes papéis: Vale do Rio Doce, CSN, Ambev, Sousa Cruz, Gerdau e Copene.
Aloísio explica que, a rigor, o valor de uma ação está diretamente relacionado ao fluxo de dividendos que o investidor espera receber. Mas acrescenta: “O fato de uma empresa não pagar bons dividendos não altera negativamente o seu perfil”.
Na opinião do analista, o valor dos dividendos deve ser escolhido de acordo com a política de pagamentos da empresa. “Pagar dividendos pode ser uma atitude administrativa incorreta. Várias empresas brasileiras, que têm destaque na bolsa, vem passando por uma fase de investimentos pesados. Logicamente, uma empresa que começa a investir muito se vê obrigada a pagar menos dividendos”, explica.
O analista cita a empresa Sousa Cruz como exemplo de boa pagadora de dividendos e justifica: “Ela tem capacidade ociosa, tem um bom nível de lucro. Como não tem necessidade de investir em tecnologia ou em novos segmentos, repassa os lucros para os acionistas através de uma taxa de dividendos elevada”. De acordo com a analista do banco Brascan, Clarissa Saldanha, a empresa paga 100% dos lucros sob a forma de dividendos.
Dividendos x Juros sobre capital próprio
Ao fim de cada exercício contábil, os acionistas de uma empresa recebem dividendos sobre o lucro obtido pela companhia. Zulmir Tres esclarece que, por lei, a empresa é obrigada a pagar no mínimo 25% de dividendos sobre os lucros para os acionistas.
Para que haja dividendos a receber, é preciso que a empresa obtenha lucro. Em caso de prejuízo, costuma-se lançar mão da reserva de lucros. Desta forma, o que o investidor recebe são juros sobre capital próprio. “Na prática, para o acionista, não faz diferença. O que muda é a forma como é contabilizado e a natureza fiscal. Os dividendos chegam líquidos para o acionista e os juros sobre capital próprio têm imposto de renda retido na fonte”, explica Aloísio Lemos. A alíquota que incide sobre os juros é de 15%.
Zulmir explica que juros não são necessariamente sinônimo de prejuízo. “Se o lucro obtido pela empresa for abaixo do esperado, pode-se utilizar os juros para complementar o valor distribuído aos acionistas e garantir que o papel continue atraente para o acionista”, afirma.